MANIFESTO

A websérie PSICANALISTAS QUE FALAM experimenta a forma-filme de uma sessão de análise, propondo uma mudança de lugares: são os protagonistas da história do movimento psicanalítico que falam de si, do que querem e do que lhes interessa, em associação livre, sem intervenções e sem roteiro de perguntas. Queremos escutar o que lhes passa pela cabeça, como no dispositivo clínico destinado a favorecer a manifestação do inconsciente.

Não editamos os discursos, só as imagens. O tempo da fala também é livre. São testemunhos pessoais de uma psicanálise ética, crítica e libertária, implicada na luta pela emancipação subjetiva e política, essencial ao projeto civilizatório. É necessário levar a psicanálise para além do divã, compartilhando um saber humanizante e fundamental, que, confinado, se degeneraria.
Os convites são feitos por transferência – afinidades teóricas e estéticas –, a partir do reconhecimento do valor e da potência trans/formadora de seu pensamento e de suas realizações, intra e extra muros. Comecei a trabalhar de forma amadora, no sentido forte de fazer por amor, em 1986, quando os meios de produção do audiovisual começavam a ser democratizados. Era o início do salto que hoje oferece acesso amplo a meios de produção, exibição e divulgação de audiovisuais, pela internet.

É preciso reafirmar a noção de interesse público presente na origem da Psicanálise. Tal dimensão parece às vezes perdida no estabelecimento de sociedades, escolas e afins, quando ao interesse legítimo de preservar o rigor da análise pessoal e da formação do analista, se amalgamam as disputas hegemônicas espúrias por prestígio, poder e mercado.
Lidar com a subjetividade e a saúde mental é condição inescapável para enfrentarmos os efeitos individuais e coletivos dos excessos de dor e desamparo, em tempos de precariedade de toda ordem.

O mundo mudou de verdade. Ainda que as grandes questões humanas permaneçam as mesmas, se apresentam de outros jeitos. Para Freud, no inconsciente somos iguais, porque somos todos humanos. Ao mesmo tempo, como seres falantes, somos atravessad@s por realidades culturais, afetivas e materiais distintas, que incidem na constituição dos sujeitos produzindo diferenças e singularidades.

Intervir no um a um e no comum é o princípio que está no cerne da causa e da prática psicanalítica. No Brasil de hoje, diante da agonia torturante da miséria, da exclusão e da destrutividade, é motivo de alegria e esperança constatar que importantes setores da psicanálise estão empenhados em ultrapassar as fronteiras do privado, dos privilégios econômico, de gênero e da branquitude – condição para fazer valer sua função no mundo, manter sua potência e garantir a própria sobrevivência.

Assim, habitantes dessa imensa dadosfera, ocupada por gente que fala a mesma e muitas outras línguas, PSICANALISTAS QUE FALAM muda seu desenho e suas cores, na procura de melhor comunicar a que veio.

 É preciso ir pra rua, o tráfego está intenso e a rua também é aqui, agora.